domingo, 5 de maio de 2013

Conversa de fim de tarde

Paralelepípedos desajustados
meu sapato vermelho
o seu tênis sujo de lama
e o trecho daquela música triste

Andávamos naquelas ruas sujas
tua mão na minha cintura
meu braço no teu pescoço
e aquele sol que quase nos deixava
completamente bêbados

Garrafas vazias e quebradas
cacos de vidro
embrulhos de comida
camisinhas usadas
e um saco de poemas
na minha bolsa.

E sua mão continuava ali
e o sol já mudava de lugar
as sombras das casas velhas
dos muros pichados
das calçadas lotadas
jogavam-se por cima de nós dois
como se o mundo inteiro
estivesse desabando
sob nossas cabeças

Nos abraçamos
estávamos suados
você cheirava a florestas
e seus olhos me lembravam a grandeza dos reis
de príncipes, de nobres
e das baratas.

Coisas inconstantes
dessas que estão aqui
mas também podem não estar
ou pior que isso:
- estão sem estar.

Você é meu? 
eu te perguntei
ainda abraçada
entregue à seus braços
e não queria uma resposta.

Demos as mãos
mais uma vez
talvez a última
ou penúltima
ou a primeira, também
e fomos subindo pelo céu
como dois balões de festa infantil
coloridos
cintilantes
e cheios
de algo tão vazio.

O amor
você cochichava no meu ouvido
é essa dor.

E naquele momento
ou não exatamente naquele momento
nos transformamos em dois pássaros
e subimos tão alto
que era impossível lembrar
se já tínhamos morado
em outro lugar.

O ninho cheirava
àquela canção
que ficou lá embaixo
com os mortais.

E eu sussurrei
porque achei que seria o momento exato
e porque poderia ser a última oportunidade:
Você é meu
mas não existe 'eu'. 

E caí
e
   te
       pu
             x
               ei
comigo





3 comentários:

Thiago Peixoto disse...

São incríveis suas escritas, uma melhor do que a outra, não acredito que só descobri hoje.

Regina Azevedo disse...

Sou pássaro aprendiz, Thi. <3

pim la piel disse...

Maravilhoso!